Eu não posso dizer que é saudade. Não posso te entregar isso numa ligação, num olhar, numa lembrança.
As lembranças que eu tenho se reunem de muitas formas diferentes, e em muitas formas diferentes tambem foi o jeito de enfrentar isso tudo.
E isso tudo tem sido dificil.
Tem sido dificil forçar uma aceitação que diz que a pior intimidade a ser perdida é a dos olhos.
Ficou dificil pousar meus olhos nos seus sem sentir o gosto que eles têm.
O gosto que eu tinha na boca quando sorria pra você, eu tambem esqueci.
Esqueci de muitas coisas. Esqueci quais as coisas tão bonitas que eu dizia pra você.
Esqueci dos detalhes das cores das primeiras flores que te entreguei. Esqueci do bilhete, do que havia escrito nele. Da cor da minha caneta, da cor do teu cartão.
Esqueci do cheiro no teu travesseiro, dos cabelos caídos pelo lençol, enroscados na minha roupa.
Esqueci das cores das tuas lingeries esquecidas num canto qualquer desse apartamento pequeno.
Do cheiro delas no teu corpo, do cheiro do teu corpo nelas. Do cheiro do teu corpo em mim.
Dos teus suspiros, teus pedidos, teus gemidos.
Esqueci como eram os meus olhos em cima de você.
Esqueci a data da primeira noite que dormimos juntos, que horas você acordou, quanto tempo eu demorei pra dormir só pra te olhar mais um pouco.
Dos sonhos que você disse ter tido comigo. De todos que tive com você.
O primeiro filme que te indiquei, o primeiro livro que vc disse ser bom. A primeira frase de efeito, a primeira resposta muda.
O teu melhor amigo que vc pensou que eu teria ciúmes. Teu ciúme das minhas amigas.
Esqueci da nossa última noite, do nosso primeiro desejo. Da nossa primeira noite que pedia um último desejo.
Esqueci de todas as coisas que não tenho me esforçado para lembrar. Mas isso não quer dizer que ainda seja vontade de esquecer. Talvez.
Talvez a unica coisa que eu não esqueça, seja de como você me atormenta ainda, fazendo com que eu perca horas em claro na madrugada pensando em como eu deveria ter esquecido de lembrar disso tudo.