terça-feira, 10 de maio de 2011

Bipolaridades.


 Juntou todas as suas melhores frases num texto pouco convincente, teceu nas linhas as letras que formavam a rede semântica colorida com os sinônimos vindos do sorriso dela.
Guardou a folha no bolso perfumado, enrolado em um plástico dobrável, colorido com adesivos de banca de jornal.

Pensou nas frases mais bonitas, seriam sua declaração em meio ao nervosismo, sem se alongar muito, olhando pro vidro do carro e torcendo para que as palavras rebatessem em todos os cantos até que morressem nos ouvidos dela.


Pensou em ligar antes para confirmar a visita, mas decidiu valorizar a surpresa.

Seguiu destino, imaginando ela saindo com o mesmo vestido que foi cúmplice na noite passada, cabelo rabo de cavalo e sorriso estampado quando o visse.
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Ela olhando no relógio da parede, lembrou de algum comentário dele sobre uma visita na noite de terça. Olhou novamente o relógio do celular e lembrou-se de desligá-lo. Desejou que ninguém viesse hoje, estava com cólica, seu ventre murmurava frases de mal humor, seu humor era resumido em uma feição de zagueira de time de rugby. Pronta pra golpear sem pudor.

Ele tocou a campainha dela, uma, duas. Esperou. Terceiro toque. Ela suspirou. Vestiu a blusa do pai, um par de meias e chinelos. 

Desceu pelo corredor já pensando em alguma forma de dispensar o jovem mancebo, que apesar de ser legal, não fodia nem saía de cima. Ela queria outra coisa. Preferia o Atroveran acompanhado por um edredom. Sozinha. Pelo menos hj, numa noite de tpm forte.

Ela se aproximou dele, desviou da boca e encostou no ouvido dele um beijo mudo e um olá forçado.

Disfarçando o mal humor, evitou o olhar. Ele, inseguro, reforçou o chão. Trocaram palavras monossilábicas. Ela comentou sobre algo na Tv que estava chato. Ele riu escondendo os dentes.

Comentou do frio que estava ali, mas não a convidou para o carro. Colocou a mão no bolso se aquecendo e deslizando o dedo no bilhete guardado.
Perguntou a ela o q estava passando na TV.

Ela respondeu que não entendia esses programas melodramáticos. A atração de hoje era um idiota qualquer que gostava de escrever baboseiras para sua namorada.

- "Como se alguém pudesse se esconder mesmo atrás de palavras..."
"Como se alguém pudesse não se esconder em palavra alguma..." - Pensou ele.

Sentiu o nó na garganta sorrindo amarelo. O frio agora apertava seus dedos dentro do casaco. A carta entre eles.

Seguiam no ritmo do clima da noite. Gelados, sem brilho de estrelas ou da lua.

Ela viu um pedaço de papel saindo bolso dele e teve um insght para uma desculpa. Disse que deveria entrar pq estava fazendo um trabalho da faculdade. Disse isso esquecendo q era o primeiro dia das férias. Ele percebeu o equívoco, esboçou um comentário, mas desistiu. Disse que ligaria no dia seguinte.
Ela não respondeu. Deu um beijo sem demora e se despediu, sem convidá-lo para entrar.

Havia uma desistência mútua não declarada.

Ele com as palavras que seriam rasgadas no caminho, jogadas aos pés do portão dela, decidido a desistir. Ela, olhando pela janela, com a certeza que ele era o cara errado, que além de não ter trazido um chocolate sequer, ainda deixou sujeira de papel picado no portão.

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